Edward, mãos de tesoura
Por Fabiane Corrêa Monteiro
Quando a chamada anunciou que naquela segunda-feira veríamos um filme inédito e a imagem de um ser muito estranho, que tinha tesouras no lugar de suas mãos, pela primeira vez surgiu diante de nossos olhos, lembro que eu e meu irmão não conseguimos acreditar que a Globo havia resolvido dedicar um espaço de sua programação para um filme aparentemente tão tolo. Estávamos nos anos 90, e aguardávamos ansiosamente pelos filmes que a TV aberta transmitiria - faltava muito ainda para que eu me tornasse frequentadora assídua de cinemas e locadoras, mais ainda para que plataformas digitais permitissem que de minha própria casa escolhesse os filmes que bem entendesse para assistir.
Mal sabíamos nós que a chamada do tipo “as loucas aventuras de um diferentão” nada dizia acerca do tema que verdadeiramente encontraríamos no filme escolhido para a ocasião, Edward, mãos de tesoura, a obra-prima de Tim Burton: esperei por um filme sem sentido, e o que encontrei foi um longa carregado de tantos significados que o amei do início ao fim. Ele conta a história de Edward (Johnny Depp), um homem criado em laboratório por um inventor (Vincent Price) que nunca concluiria sua grande obra: morreria antes, quando ainda estavam faltando as mãos da criatura, deixando-a com as tesouras que haviam sido colocadas provisoriamente, e sem qualquer maldade em relação ao mundo que descobriria a seguir; a tentativa frustrada de uma senhora (Dianne Wiest) por tornar essa criatura parte de uma sociedade incapaz de lidar com as diferenças, incapaz de identificar-se com o sofrimento alheio, é que confere à obra o status de fábula moderna que tem: uma fábula cujo maior ensinamento talvez tenha sido alertar-nos à crueldade de que somos capazes quando confrontados por quem a nossos padrões de normalidade não tiver correspondido.
Quase trinta anos depois, não por acaso fiz de seu possível diálogo com Frankenstein, a obra-prima de Mary Shelley, o tema do artigo de conclusão de minha pós-graduação; quase trinta anos depois, e ainda me pego a chorar quando chego ao final deste filme e vejo Edward tendo de abdicar de seu grande amor (Winona Ryder) para isolar-se novamente e viver em paz.
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