Quatro títulos para que recordemos a vocação que um dia
todos tivemos para sonhar
Por Fabiane Corrêa Monteiro
Em um certo aniversário, tendo reunido alguns de meus familiares em comemoração, dei a meu sobrinho e afilhado, ainda criança na época, os balões com que havia decorado minha casa, para que ele brincasse. “Fiquei rico de balão!”, disse-me o Gabriel, o que bastou para que inevitavelmente fosse transportada à infância, quando somos tão inocentes que balões e brinquedos bastam para que nos consideremos ricos.
Um balão a um adulto pode não passar de um artefato decorativo, a ser descartado assim que terminar a festa. À criança, é muitas vezes o que basta para que dê corda em sua imaginação a um mundo de sonhos. Quando brincava com as minhas bonecas, criava-lhes inúmeras histórias; quando brincava de escolinha, dava aula a inúmeros alunos imaginários. Uma pilha de tijolos na calçada tornava-se um palco para apresentações, e com tijolos enfileirados no chão, demarcando a base de paredes imaginárias, eu brincava de casinha com as minhas panelinhas. Um mundo de sonho e de aventura abria-se diante de mim, tão logo algum amiguinho me convidasse para brincar.
Isso porque, para que a criança se transporte a um mundo de sonho e de aventura, é apenas necessário que algo estimule sua imaginação, sua curiosidade. É como acontece no enredo que se desenrola em O jardim secreto: na adaptação cinematográfica realizada em 1993 da obra de Frances Hodgson Burnett, uma chave encontrada em meio aos pertences de uma tia já falecida leva uma menina a descobrir um jardim secreto e abandonado, em meio ao ambiente novo e hostil a que tentava se adaptar após a morte de seus pais. Sua descoberta e dedicação ao jardim transformam a sua vida e transformam a vida das pessoas ao redor, tudo passa (ou torna) a florir.

Mary Lennox (Kate Maberly) em O jardim secreto
Se no filme O jardim secreto uma chave foi capaz de operar tamanha transformação na vida de uma menina e de todos ao redor, pode-se dizer que no filme Os Goonies, de 1985, foi o mapa de um tesouro, o mapa que levou ao tesouro perdido de Willy Caolho, impedindo que inúmeras famílias fossem despejadas. Em A fantástica fábrica de chocolate, a adaptação cinematográfica realizada em 1971, ou mesmo a realizada em 2005, para a obra de Roald Dahl, é um bilhete premiado que permite a passagem para um mundo encantado, quando cinco crianças agraciadas com um bilhete dourado participam da expedição realizada pelo excêntrico Willy Wonka a sua fantástica fábrica de chocolates, a fim de que escolhesse entre as crianças aquela que o substituiria, já que estava velho e não possuía herdeiros.

Os Goonies (da esquerda para direita): Jeff Cohen, Sean Astin, Corey Feldman
e Ke Huy Quan

Willy Wonka (Gene Wilder) e o menino escolhido (Peter Ostrum)
em A fantástica fábrica de chocolate de 1971
Esse mundo de aventuras, muitas vezes, também serve como refúgio, quando as coisas não andam bem e a criança recorre à fantasia para fugir da realidade, suportá-la, digeri-la. É o que acontece no filme A história sem fim, de 1984, em que um menino encontra em um livro um meio de lidar com a perda de sua mãe, um pai ocupado demais para lhe dar atenção e o bullying que sofria de seus colegas de escola. Há uma cena antológica em que o cavalo de um dos personagens precisa atravessar um pântano e começa a afundar, porque deixou que a tristeza tomasse conta de seu coração; é uma clara analogia à perda do menino: precisamos viver o luto, mas precisamos também seguir a vida, para que não afundemos em nossa própria tristeza.

O protagonista do filme A história sem fim (Barret Oliver)
Há outros filmes que tratam da mesma temática, abordando-a por meio de um viés semelhante ao de A história sem fim, como Sete minutos depois da meia-noite (2016) e Onde vivem os monstros (2009), sobre os quais talvez ainda escreva um dia. Basta que por ora nos atentemos aos títulos que citei, o suficiente para que todos recordemos a vocação que um dia tivemos para sonhar.
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